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Outras reflexões

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Da transformação histórica do ornitorrinco
chamado milícia e
da ‘paroquialização’

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Alexandre Werneck

UFRJ

Reprodução

Ornitorrinco.jpg

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Em 2015, publiquei em Dilemas o artigo “O ornitorrinco de criminalização: A construção social moral do miliciano a partir dos personagens da ‘violência urbana’ do Rio de Janeiro”. Nele, demonstrei como, para ser compreendido no contexto da representação social violência urbana, o amplo espectro de imagens mentais socialmente partilhadas que representa uma ordem social como “violenta”(1), o miliciano precisava ser pensado pela metáfora do ornitorrinco, isto é, como criatura formada por partes de outras criaturas (já conhecidas), tratadas no texto como actantes, no sentido de Greimas/Latour, tendo em si versões extremas de cada uma dessas partes. Os seres componentes daquele ornitorrinco eram o policial corrupto, o matador e o traficante, sendo ele representado como versão combinada em variáveis medidas das características centrais de cada um desses.

Naquele momento, especialmente a partir da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) fluminense de 2008, a milícia passou a ser compreendida para além do que chamo no texto de “mito da pacificação primitiva”, a ingênua ideia de que agentes do Estado locais se uniam a cidadãos “civis” também locais para criar “sistemas de autoproteção comunitária”, como (fazia sentido falar isso em 2015) UPPs avant la lettre(2). Com a CPI, ficou explícito o fato de se tratar não de uma “quadrilha”, um “comando” ou “facção”, mas de um modus operandi. Segundo este, agentes do Estado fazem uso privatizado de seu monopólio formalmente legitimado de uso da força para explorar monopólios ilegais de venda de bens e serviços (arregimentando outros, não agentes do Estado)(3). E isso lançou luz sobre uma outra construção social moral para outro elemento da equação: para funcionar, esse modelo precisaria contar constitutivamente com a colaboração de integrantes das políticas municipal, estadual e, eventualmente, federal. 

Passada uma década, e observando a, digamos, ecologia desse personagem, tanto como pesquisador concentrado na interface entre sociologia da moral e sociologia do crime e da violência quanto como cidadão atento à política do país, vejo a necessidade de revisão dessa taxonomia. Essa conclusão se fundamenta em duas percepções. A primeira é que mesmo já tendo se consolidado no cenário da violência urbana no Rio de Janeiro e no restante do país(4), o miliciano permanece um ornitorrinco: é um animal em si mesmo, mas não se olha para ele sem se perceber o bico de pato, o corpo de castor, o comportamento de mamífero e de ave. O hibridismo segue sendo uma marca constitutiva desse que se consolidou como um novo protagonista da violência urbana/segurança pública no país, ao lado dos chamados “comandos” e/ou “facções”.

A segunda percepção é o objeto deste texto: ao longo desses quase 10 anos, consolidou-se uma dinâmica de ovo/galinha em relação ao miliciano, que chamarei aqui de “vereadorização” ou, mais adequadamente, “paroquialização” da política por meio dele. Lida desde a CPI como algoz de populações inteiras que explora, além de usurpadora de um espaço na estrutura estatal que deveria ser utilizado para o bem comum, mas em vez disso é usado para uma “acumulação capitalista seguida de morte” (fundamentada no que Michel Misse chamou de mercadorias políticas, aquelas cujas trocas mercantis são centradas no uso da força), essa quimera passou a depender para ser moralmente construída, argumento, de um novo componente: o actante vereador corrupto

Falo em “vereador”, e não em “parlamentar” ou em “político”, porque tenho a impressão de que esse actante sintetiza uma dimensão fundamental desse fenômeno, a operacionalização de preocupações prioritariamente locais mesmo em âmbito mais elevado das esferas do poder no país. Daí o actante “vereador” poder ser usado para se referir a um vereador, um deputado, um juiz, um ministro, um presidente – um que, por exemplo, leve para o plano nacional preocupações de dimensões tão apequenadas quanto o prejuízo de garimpeiros com a destruição de máquinas ilegais em detrimento de um problema global como o desmatamento ilegal; ou o porte de armas para colecionadores como direito fundamental etc.(5)  Essa vereadorização, essa, assim, paroquialização da política no país cria novas relações de força e poder locais e nacionais e tem pressionado a política pública brasileira para se tornar, como descreve Jonathan Simon, “governo por meio do crime”, a lógica segundo a qual a política pública de qualquer área precisa ser traduzida em política de crime para prosperar. A existência de uma “Bancada da Bala” (ou “Frente Parlamentar da Segurança Pública”, como se apresenta) no Congresso Nacional e a cada vez maior exigência de ingresso do governo federal como agente na segurança pública local – responsabilidade policial dos governos estaduais e infraestrutural dos municipais – explicita ao mesmo tempo essa paroquialização da política nacional e o avanço daquele modus operandi criminal da milícia para uma escala mais ampla(6). Além disso, é cada vez maior o avanço do que os pesquisadores da ONG Sou da Paz chamam de “policialismo”, o ingresso no jogo político de candidatos oriundos das forças policiais: no pleito de 2024 foram 856 eleitos no primeiro turno para os Legislativos e Executivos municipais(7). Sem promover uma preconceituosa conexão automática, é importante dizer que isso é preocupante, porque embora as configurações venham se transformando e haja um crescimento de cabeças “civis”, as forças policiais ainda são a principal fonte de quadros de liderança das milícias. E se não chegam na política como representantes diretos de uma milícia, esses atores, ao centrarem sua atuação na “segurança pública”, o fazem com projetos de mobilização da força amplamente integrados à forma de atuação dos milicianos.

Seja qual for a origem, os parlamentares associados/associáveis à milícia podem ter cumplicidade efetiva com ela (desde serem oriundos diretamente de suas hostes a receberem apoio de suas “lideranças locais”) ou apenas uma conexão “filosófica” com sua forma de gerir a cidade/a segurança. No primeiro caso, atuam mais diretamente como facilitadores da atuação desta, tanto por ações demagógicas favorecendo benesses locais quanto pela utilização da máquina de Legislativo/Executivo/Judiciário em seu favor (como na facilitação de empreendimentos imobiliários irregulares). No outro caso, atuam colocando sua eloquência de figuras públicas a serviço daquele citado modus operandi, tanto por conclamarem o uso de uma força destruidora contra “a bandidagem” – uso ao qual a própria milícia eventualmente se integra e pelo qual é tolerada – seja por apontar espaços vazios do poder estatal eventualmente ocupáveis por esses grupos. 

No artigo de 2015, apresentei uma matriz mapeando as principais características taxonômicas de cada “animal” contribuinte como “parte” do ornitorrinco. A ideia era que cada ser se integrava no “híbrido” segundo seu traço mais determinante quando este atuasse em máxima actância: um miliciano é um miliciano porque as pessoas sabem reconhecer as características representacionais mais fortes de um traficante, de um matador e de um policial corrupto – ver a tabelas nas páginas 447 e 448 do artigo.

Meu ponto agora é que o sequestro da política – tanto a eleitoral quanto a estatal quanto ainda a ideia mesma de política pública – por esse (já não tão) novo personagem, sequestro explicitado notadamente a partir da CPI de 2008, chamou atenção para seu empreendedorismo capitalista, desmistificando a dinâmica da “cobrança por segurança” que parecia justificá-lo (para muitas camadas da população) em certo momento histórico, explicitando uma lógica de atividade criminal totalmente diferente da mitologicamente apresentada desde então, e isso foi o grande responsável pelo crescimento da importância do miliciano como personagem simbólico. Se as ligações com políticos corruptos já eram constitutivas de sua atuação do ponto de vista objetivo, as construções do “candidato miliciano” – por meio de uma série de estigmas que não poderei explorar aqui, mas que receberá minha atenção futuramente –, do “representante da milícia” no poder e das “pautas de milícia” levaram para o imaginário da violência urbana, agora nacionalizado, um novo elemento.

Os casos Marielle Franco e Patrícia Acioli são enormemente relevadores dessa transformação. O assassinato da vereadora, em 2018, em plena campanha eleitoral presidencial, ocorreu sete anos depois do da juíza. A diferença de escalada em generalidade (como se pode dizer adaptando Boltanski) entre as duas histórias é gritante: “morta pela ‘milícia’” (as aspas não são para relativizar nada, mas para expressar a polissemia do termo entre os dois casos) de forma semelhante à da magistrada, a parlamentar se tornou desde imediatamente uma questão nacional. Em parte, porque o crime revelava um nível de comprometimento do poder político distinto: a morte da juíza foi ordenada “de dentro do Batalhão da PM”; a da vereadora, desconfiava-se desde o começo e agora se confirma, de um gabinete parlamentar. 

Essa passagem entre os dois crimes expressa bem como a paroquialização – que inclusive dá sentido aos dois, chamemos bem informalmente, “crimes de jagunço” – chega a um nível do poder antes inconcebível no plano simbólico: a política dos interesses locais se eleva para o nível federal conforme as carreiras de “políticos milicianos” avança e são levadas para o plano da grande política questões de interesse dessa (já não tão) nova indústria criminal. 

Esse movimento de sanfona entre esferas do poder explicita ainda mais a paroquialização e se efetiva com a consolidação de uma forma complexificada do ornitorrinco, com o actante vereador como elemento fundamental. E isso chama atenção para como o ornitorrinco se tornou ainda mais ameaçador – justamente porque passa a frequentar as esferas dos poderes (notadamente o Legislativo, mas também o Executivo e o Judiciário, como sabemos). E embora lance luz sobre o caráter ainda mais deletério de um Estado punitivista por meio de sua privatização por atores interessados em uma acumulação capitalista que já não precisa estar centrada na morte como moeda de troca, mas passa por essa morte em sua efetivação, utilizando-a para regular preços e monopólios, esse enquadramento também ajuda a enxergar algo que não podemos deixar de observar: a dimensão eleitoral e de expressão pública sublinha a nossa responsabilidade, como sociedade, pelos vários resultados deletérios daquela privatização(8). É a sociedade – notadamente os autointitulados “cidadãos de bem”, como exploram Michel Misse e Vittorio Talone em Dilemas – quem conclama essas mobilizações de força com seu punitivismo difuso e torna a milícia em parte algo naturalizado na política.

A paroquialização, nesse sentido, insere na genética do ornitorrinco outro animal que não estava claro até há pouco ser integrante de sua morfologia. Assim, faz-se necessária uma revisão daquela primeira matriz, com o ingresso das características mais marcantes do vereador corrupto e algumas importantes revisões/atualizações. Ei-la, então, para encerrar esta etapa do raciocínio, a ser consolidada em trabalhos futuros:

 

AS PARTES DO ORNITORRINCO A PARTIR DOS ACTANTES DA VIOLÊNCIA URBANA
 

Sugestões de leitura

 

ALVES, José Cláudio Souza. “Milícias: Mudança na economia política do crime no Rio de Janeiro”. In: JUSTIÇA GLOBAL (org.). Segurança, tráfico e milícias no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Justiça Global/Fundação Heinrich Böll, 2008, pp. 33-36.


ALVES, José Cláudio Souza. “Milícias: Quando o Estado é o crime”. In: RUEDIGUER, Marco Aurélio; LIMA, Renato Sergio (orgs.). Segurança pública após 1988: História de uma construção inacabada. Rio de Janeiro: FGV, 2019, pp. 47-64.


ARAÚJO, Vera. “Milícias de PMs expulsam tráfico: Grupos de PMs assumem o controle em 42 favelas, mas há denúncias de abusos”. O Globo, Rio, 20 mar. 2005, p. 18.


CANO, Ignacio; IOOT, Carolina. “Seis por meia dúzia? Um estudo exploratório do fenômeno das chamadas ‘milícias’ no Rio de Janeiro”. In: JUSTIÇA GLOBAL (org.). Segurança, tráfico e milícia no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Fundação Heinrich Böll, 2008, pp. 48-103.


CANO, Ignacio; DUARTE, Thais. ‘No sapatinho’: A evolução das milícias no Rio de Janeiro (2008-2011). Rio de Janeiro, LAV/Fundação Heinrich Böll, 2012.


CPI DAS MILÍCIAS. Relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito Destinada a Investigar a Ação de Milícias no Âmbito do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), 2008.


LEITE, Márcia Pereira. “Da ‘metáfora da guerra’ ao projeto de ‘pacificação’: Favelas e políticas de segurança pública no Rio de Janeiro”. Revista Brasileira de Segurança Pública, vol. 6, n. 2, 2012, pp. 374-389. 


MACHADO DA SILVA, Luiz Antônio. “Violência urbana: Representação de uma ordem social”. In: NASCIMENTO, Elimar Pinheiro; BARREIRA, Irlys. Brasil urbano: Cenário da ordem e da desordem. Rio de Janeiro: Notrya, 1993, pp. 131-142.


MACHADO DA SILVA, Luiz Antônio (org.). Vida sob cerco: Violência e rotina nas favelas do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 2008.


MANSO, Bruno Paes. República das milícias: Dos esquadrões da morte à era Bolsonaro. São Paulo: Todavia, 2020.


MELLO NETO, David Maciel de. Esquadrão da morte: Genealogia de uma categoria da violência urbana no Rio de Janeiro (1957-1987). Dissertação (mestrado), PPGSA, UFRJ, 2014.


MISSE, Michel. Malandros, marginais e vagabundos: A acumulação social da violência no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Lamparina, 2022[1999].


MISSE, Michel. “Crime organizado e crime comum no Rio de Janeiro: Diferenças e afinidades”. Revista de Sociologia e Política, vol. 19, n. 40, pp. 13-25, 2011.


MISSE, Michel. “Mercadorias políticas”. In: LIMA, Renato Sérgio de; RATTON, José Luiz; AZEVEDO, Rodrigo (orgs). Crime, polícia e Justiça no Brasil. São Paulo: Contexto, 2014, p. 200-230.


MISSE, Michel; TALONE, Vittorio. “Cidadãos de bem e sujeitos criminais: A construção de oposições na acumulação social da violência no Rio de Janeiro”. Dilemas: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social, vol. 17, n. 3, 2024 (no prelo). 


MOTTA, Jonathan Willian Bazoni da. “As múltiplas faces da milícia Liga da Justiça: Reorientação moral e deslocamento político na Zona Oeste do Rio de Janeiro”. Dilemas: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social, vol. 17, n. 2, 2024.


NOVELLO, Roberta Heleno; ALVAREZ, Marcos César. “Da ‘bancada da segurança’ à ‘bancada da bala’: Deputados-policiais no legislativo paulista e discursos sobre segurança pública”. Dilemas: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social, vol. 15, n. 1, pp. 81-101, 2022.


PORTO, Maria Stela Grossi. “A violência urbana e suas representações sociais: O caso do Distrito Federal”. São Paulo em Perspectiva, vol. 13, n. 4, pp. 130-135, 1999.


SIMON, Jonathan. Governing Through Crime: How the War on Crime Transformed American Democracy and Created a Culture of Fear. Nova York: Oxford University Press, 2007.


SOARES, Rafael. Milicianos: Como agentes formados para combater o crime passaram a matar a serviço dele. Rio de Janeiro: Objetiva, 2023.


WERNECK, Alexandre. “O ornitorrinco de criminalização: A construção social moral do miliciano a partir dos personagens da ‘violência urbana’ do Rio de Janeiro”. Dilemas: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social, vol. 8, n. 3, pp. 429-454, 2015.


WERNECK, Alexandre. “The Force of Grace, the Grace of Force: Joking Critique of Figures of ‘Urban Violence’ on the Covers of a Tabloid Newspaper as the ‘Violentization’ of Public Discourse”. Dilemas: Revista de Estudos de Conflito e Controle Social, vol. 15, n. 3, pp.  735-773, 2022.


WERNECK, Alexandre; TEIXEIRA, Cesar Pinheiro; TALONE, Vittorio. “An outline of a pragmatic sociology of ‘violence’”. Sociologias, vol. 22, n. 54, p. 286-326, 2020.


WERNECK, Alexandre; TEIXEIRA, Cesar Pinheiro; TALONE, Vittorio; CAMINHAS, Diogo. “Forças em forma: uma sociologia pragmática da ‘violentização’ da força em diferentes modalidades”. Sociologias, vol. 26, 2024.

Notas

1  Mais recentemente, eu e colegas (WERNECK et al., 2020, 2024) começamos a falar em violentização como um processo segundo o qual as pessoas constroem socialmente como de violência as situações em que se veem imersas intermediadas pelo uso de diferenças notáveis de força(s) mobilizada(s). O que está em jogo aqui, então, em nossos termos, é a violentização da relação entre político, população e crime.


2  É curioso que hoje pareça algo distante a chamada “Era das UPPs”, o período que muitos trabalhos – um meu incluído (WERNECK, 2022) – apontam situado entre 2008 e 2017 e marcado pela política pública das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), bastante bem-sucedida em reduzir taxas de homicídio no RJ (especialmente porque reduziu a prática da operação policial, importante motivo de mortes em favelas). O período também representou um momento de transformações na “vida sob cerco” (MACHADO DA SILVA, 2008) e, ao mesmo tempo, desempenhou um papel no avanço das milícias, uma vez que a economia dos chamados arregos sofreu abalos em paralelo ao fim da ostensividade da presença do tráfico nas favelas, entre outras dinâmicas. Explorar mais essa relação ultrapassaria os limites deste texto.


3  Não obstante, pode-se dizer que o modelo paradigmático – inclusive para a CPI – tenha sido e ainda seja a Liga da Justiça, milícia formada na Zona Oeste no meio da década de 1995. Ela oferecia o mix modelar de agentes do Estado (policiais, bombeiros e parlamentares), civis, organização paramilitar e exploração de bens e serviços – notadamente, no começo, transporte alternativo, mas não apenas. Para mais, ver Motta (2024).


4  O sucesso do filme Tropa de elite 2: O inimigo agora é outro (2010) é um indicativo do espraiamento dessa representação.


5  Esse tipo de mecânica já havia sido experimentado em outros governos nacionais, notadamente no de Jânio Quadros (1961), notoriamente ridicularizado por levar para a esfera federal questões como a moralidade das brigas de galo e que tais. Mas isso figurava como resíduo anedótico de uma política nacional mais complexa em períodos pós e pré ditatoriais. O movimento observado agora consiste em um avanço sistemático das pautas locais – e a da segurança pública ocupa centralidade nessa discussão – sobre a grande política federal.


6  Vários trabalhos podem ser arrolados para reforçar a densidade empírica dessa afirmação. Destaco entretanto os livros de Rafael Soares e Bruno Paes Manso, ambos listados nas Sugestões de leitura. Ao mesmo tempo, a elevação da pauta da segurança pública à amplitude nacional é um componente dessa nacionalização da milícia – como explorou Renato Sérgio de Lima neste mesmo espaço.


7  Ver: ANDRADE, Matheus Gouveia de. “856 policiais eleitos: O que está por trás e quais os riscos para a política?”. Deutsche Welle Brasil, UOL News, Eleições 2024, 14 de outubro de 2024.


8  Estou evidentemente construindo um “nós” generalizante para além das complexidades e discordâncias. Obviamente, boa parte de nós – notadamente na academia e nos movimentos sociais e na política tradicional, mas não apenas – combatemos essa configuração, cujos pressupostos morais se transformaram consideravelmente também na última década, mas esse é tema para outro texto.

Ilustração zoológica a bico de pena de um ornitorrinco. Autor não identificado

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ALEXANDRE WERNECK (av.werneck@ifcs.ufrj.br) é professor do Departamento de Sociologia e do Programa de Pós-Graduação em Sociologia e Antropologia (PPGSA) da UFRJ e coordenador geral do Necvu. É doutor pelo PPGSA/UFRJ e autor de A desculpa: As circunstâncias e a moral das relações sociais (2012).

Publicado em: 25/10/2024

DILEMAS: REFLEXÕES é uma seção especial (blog) de DILEMAS: REVISTA DE ESTUDOS DE CONFLITO E CONTROLE SOCIAL (ISSN Eletrônico: 2178-2792; ISSN Impresso: 1983-5922) e é publicada pelo Núcleo de Estudos da Cidadania, Conflito e Violência Urbana (Necvu) da UFRJ, integrante do INCT/CNPq INViPS. DILEMAS: REFLEXÕES não se responsabiliza por informações, opiniões e outros elementos dos textos aqui publicados. Estes são de inteira responsabilidade de seus autores

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